24/05/2011

Câmara de Lisboa pagou pareceres jurídicos cujo paradeiro se desconhece

In Público (24/5/2011)
José António Cerejo

«Pagamento ultrapassou os 23 mil euros. Sociedade contratada para fazer os estudos garante que eles foram feitos, mas ninguém sabe onde estão. O contrato foi depois anulado


A Câmara de Lisboa pagou 23.196 euros, em 2009, por um estudo jurídico de cuja existência os serviços do município duvidam, mas que nunca esclareceram se foi feito. O trabalho em causa era um dos quatro previstos num contrato celebrado, por ajuste directo, com uma sociedade de advogados, no valor de 46.392 euros (mais IVA), e que foi anulado por causa de um alegado conflito de interesses, relativo a uma das intervenientes.

Celebrado em Dezembro de 2008, o contrato, subscrito pelo então director municipal de Cultura, Rui Pereira, e pela sociedade Amaral & Lourenço - representada pela advogada Inês Amaral -, previa um estudo sobre o Museu do Design e da Moda (Mude) e três outros trabalhos, referentes à Casa Fernando Pessoa e às fundações que se dedicam à promoção de grandes autores. A proposta de adjudicação foi assinada, em Novembro, pela advogada Adelaide Silva, que, tal como Inês Amaral, assessorava Rui Pereira, ao abrigo de um contrato de avença que terminava a 31 de Dezembro.

Nos termos contratuais, a Amaral & Lourenço - de que Inês Amaral era uma das duas sócias - receberia os primeiros 23.196 euros contra a "entrega do estudo sobre a titularidade dos direitos de autor que recaem sobre o espólio de Fernando Pessoa, propriedade da Câmara de Lisboa". Sete dias depois do final das avenças de ambas as juristas, a 7 de Janeiro de 2009, a sociedade apresentou a primeira factura, tendo Rui Pereira - que quatro dias depois passaria a director municipal de Recursos Humanos - autorizado o pagamento. Seis meses depois, foi apresentada uma segunda factura, com os restantes 50 por cento, juntamente com um parecer sobre as "soluções jurídicas para o futuro" do Mude, assinado por Adelaide Silva e Inês Amaral.

Confrontada com o facto de a primeira destas advogadas ser a autora da proposta de contratação da sociedade, e com a não entrega dos estudos relativos à "protecção da marca Casa Fernando Pessoa" e às fundações, a então vereadora da Cultura, Rosalia Vargas, que não quis falar ao PÚBLICO, pediu a apreciação jurídica do caso, concluindo pela invalidade da contratação. De acordo com o serviço de Ouvidoria do município, "existe um notório conflito de interesses", que gera a anulação do contrato, no facto de a proposta de adjudicação ter sido assinada, enquanto prestadora de serviços da câmara, pela mesma advogada que subscreveu, em Julho de 2009, o parecer sobre o Mude. O documento salienta que "não existe qualquer registo associado à entrega" do primeiro parecer, "pelo que é impossível confirmar a sua efectiva entrega e eventual destino". Já quanto aos trabalhos sobre a protecção da marca Casa Fernando Pessoa e sobre as fundações, o texto, que mereceu a aprovação da vereadora da Cultura, insiste em que se desconhece "se [os mesmos] foram realizados e entregues".

Contactado pelo PÚBLICO, Rui Pereira garantiu que o primeiro trabalho lhe foi, de facto, entregue e que o mesmo "ficou nos serviços". Foi, aliás, "fazendo fé" nessa confirmação do ex-director, assinalada sobre a própria factura, que a directora do Departamento Jurídico e a vereadora entenderam "não haver lugar à devolução da quantia já paga".

Rui Pereira - que está em vias de ser substituído como director dos Recursos Humanos ao abrigo da reestruturação dos serviços e era um dos dois únicos directores municipais pertencentes ao PSD - assegurou também que "ignorava, de todo, que a drª Adelaide Silva viria a ser contratada" pela sociedade Amaral & Lourenço para fazer o estudo sobre o Mude.

Na sequência do parecer da Ouvidoria, o contrato com esta sociedade foi anulado pela câmara e o trabalho sobre o Mude devolvido, não sendo paga a segunda factura apresentada.

Advogada rejeita existência de ilegalidades

"Não houve nenhuma ilegalidade cometida pela minha sociedade e o procedimento da CML foi completamente legal e regular", diz Inês Amaral. A advogada sustenta que não se verificou qualquer conflito de interesses porque quando contratou Adelaide Silva (que o PÚBLICO não conseguiu ouvir), para participar no estudo sobre o Mude, "ela já não tinha qualquer ligação à CML". Em todo o caso, salientou, se existisse conflito seria em relação à sua colega e seria a Ordem dos Advogados que caberia avaliá-lo. Inês Amaral garante que entregou o primeiro estudo contratado, juntamente com os estatutos da Fundação Casa Fernando Pessoa que a CML pretendia criar, e que com o parecer sobre o Mude foram entregues todos os outros trabalhos contratados. A directora da Casa Fernando Pessoa, Inês Pedrosa, diz, porém, que não conhece nenhum desses estudos, um dos quais foi por si sugerido, e que os estatutos da fundação "ficaram prontos no fim de 2008", sendo elaborados por uma especialista na matéria, com o acompanhamento de Adelaide Silva e Inês Amaral, "na qualidade de assessoras jurídicas da Direcção Municipal de Cultura, que à época eram". J.A.C. »

7 comentários:

Julio Amorim disse...

"Sociedade contratada para fazer os estudos garante que eles foram feitos, mas ninguém sabe onde estão.".....??

Que infantário é este que não guarda cópias dos seus trabalhos?

Anónimo disse...

E pensava o fanfarrão que ia para o gabinete da vereadora do pessoal controlar a sua sucessora nos recursos humanos da Câmara!!! Já devia ter percebido que a mosquinha parece morta, mas não. Ela finge tão bem...Cuidem-se!

Anónimo disse...

Pois isto é um caso de família

Sim, detalhemos. Ora, portanto, Rui Pereira, casado com Joana Amaral, irmã de Inês Amaral. São portanto cunhados. Já não bastava alguém contratar a cunhada para assessora, mas a assessora propõe ao cunhado director municipal a contratação dela própria enquanto advogada externa à Câmara. E são cunhados. E ela própria, enquanto assessora, com o seu bom ordenado mensal, não tinha incumbência de fazer o decerto douto parecer cuja existência é agora mistério? Para além de assessora durante uns anos com o seu bom ordenado mensal, ainda recebeu mais uns 23 mil euros por fora? E este Rui Pereira, cujo escrupuloso sentido de serviço público e verticalidade é há muito conhecido na Câmara, fica na mesma, deixam-no ir-se embora sem mais nada, se calhar até com um louvor de um vereador em boletim ...
(postado por anónimo no público)

Anónimo disse...

Quem nos acode?

E ninguém vai preso? Na Câmara de Lisboa, com tantos funcionários, não há gente capaz de fazer estudos destes? O presidente da Câmara soube disto? Sabendo-se que histórias destas acontecem por todos o lado onde o Estado se instalou, julgo que é uma obrigação de todos nós denuncia-las. chamando os nomes aos bois que, quase sempre também são boys...
Carlos Lopes , Porto. 24.05.2011 15:05

Anónimo disse...

Silvio Pata . 24.05.2011 21:22

Via Facebook

é fácil de resolver.

Descontar nos salários do presidente e dos gestores, vereadores e outros responsáveis do município, se assim for verão que logo aparece quem mandou fazer, mas se o povo pagar nada é apurado e para o ano vamos ter mais. Se forem os da CML a pagar começam a ser polícias uns dos outros e acaba o forró. Isto é uma falta de respeito pelos munícipes. Eu não sou de Lx mas acho que devo manifestar-me sobre este assunto. estes socialistas são bem piores do que o terramoto de 1755, só que desta vez não caem os edifícios, mas vazam as gavetas todas e para além das gavetas também os porta-moedas e os bolsos dos portugueses

Anónimo disse...

Anónimo , porto. 25.05.2011 11:38

Mistério da Câmara de Lisboa

É uma boa maneira de disfarçar «benesses» sem ter que as justificar.Quem esconde lá sabe porquê e de certeza que não é por bem.Fá-lo com intenção, mas infelizmente as intenções destes famosos socialistas ou de quem os apoia são factos que ficarão na história como «crimes por descobrir » e por isso nunca se acharão os verdadeiros criminosos.Morrem como «honestinhos» quando as suas almas vão mais pesadas que uma pedreira.O pago lá chegará.Não tenho qualquer dúvida que quem age por mal,por fraude,por corrupção ,tem os seus dias de «felicidade »contados».Quando estes pareceres são feitos ficam sempre cópias onde esses pareceres são feitos e originais e cópias de quem os manda fazer.É uma questão de «coscuvilhar».

funcionário da cãimbra disse...

Pois é. Por estas e por outras é que tenho cada vez mais nojo de quem fala mal genericamente dos funcionários da CML, porque quem tem de facto as mãos bem sujas são estas chefias políticas, estes assessores políticos, estes vereadores e este alcaide. Haveria juristas na câmara capazes de fazer este estudo jurídico? É claro que sim. Há muitos bons profissionais na câmara, mas cujo trabalho está permanentemente à mercê destes camelos. Camelos demagogos, ainda por cima, que vivem à custa de falar mal dos funcionários da câmara, o que desculpa os camelos e só os torna mais necessários, para "domar" os funcionários públicos... que toda a gente "sabe" que são uns calaceiros