15/06/2009

Terreiro do Paço não está a correr a António Costa como pretenderia

In Público (14/6/2009)
Ana Henriques

«Mesmo não lhe sendo, segundo os especialistas, fatal em termos eleitorais, presidente da câmara vai ter de gerir com pinças remodelação da praça


Não sendo uma obra sua, é das que mais transtornos lhe têm trazido desde que tomou posse - só comparável aos dissabores que lhe causou o alargamento do terminal de contentores de Alcântara, outra decisão do Governo com repercussões pouco simpáticas na imagem da actual gestão da Câmara de Lisboa. A escassos quatro meses das eleições autárquicas, a remodelação do Terreiro do Paço converteu-se de trunfo eleitoral de António Costa em assunto incómodo, por via da onda crescente de contestação ao projecto.
Os losangos desenhados pelo arquitecto Bruno Soares para o pavimento da praça central são um dos motivos da discórdia. Outro relaciona-se com a sua sobreelevação no lado virado ao Tejo. O arquitecto pretende que a placa central fique num plano mais elevado do que o Cais das Colunas, ao qual se acederia depois de se descer do centro da praça por degraus ou rampas. O facto de Bruno Soares ter sido nomeado, e não escolhido por concurso, é outro motivo de protesto. As objecções ao projecto têm sido transversais, dos serviços camarários ao Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico, passando por personalidades como a directora do Museu dos Coches, José Miguel Júdice ou Maria Filomena Mónica. Foram também vários os reparos feitos pela comissão de especialistas encarregue de acompanhar o trabalho de Bruno Soares - que se remeteu ao silêncio nas últimas semanas para reformular o projecto, em fase de estudo prévio.
Na blogosfera e no abaixo-assinado on-line pedindo a abertura de uma discussão pública sobre o futuro da Praça do Comércio, multiplicam-se as críticas não só ao Governo, que está a promover esta e outras obras à beira-rio através da sociedade de capitais públicos Frente Tejo, como à própria autarquia - apesar de, do ponto de vista formal, o papel desta última ser menor no empreendimento, pois trata-se de uma obra do Estado. A recente apreciação do projecto pela câmara - um procedimento aparentemente inútil, uma vez que as obras da administração central não precisam de licenciamento municipal - veio acentuar o equívoco, com António Costa a ter de exercer o seu voto de qualidade para desempatar uma votação que por pouco não redundou num "não" do executivo camarário aos planos de Bruno Soares.
Santana aproveita
No PSD, há já quem comente em surdina que a Praça do Comércio pode ser para o presidente da câmara aquilo que o projecto do elevador para o Castelo de S. Jorge foi para João Soares - um episódio que parecia menor mas que, numa disputa eleitoral taco-
-a-taco, terá ajudado a comprometer a vitória do socialista nas autárquicas de 2001. Quis o destino que quem roubou nessa altura o município a João Soares seja o mesmo adversário que António Costa vai ter pela frente em Outubro: Santana Lopes, que, tendo percebido a vantagem que lhe pode dar o descontentamento com o Terreiro do Paço, investiu no tema, tendo acusado a câmara de se estar a vergar ao Governo (ver texto nestas páginas).
Será, de facto, esta uma questão que pode deitar a perder António Costa, numa cidade em que, nas eleições europeias, o PS superou o PSD por menos de um ponto percentual? A acreditar em alguns especialistas ouvidos pelo PÚBLICO, o autarca não corre esse risco. "O Terreiro do Paço não é susceptível de ser fatal a António Costa", opina o politólogo António Costa Pinto. Essa é também a opinião do sociólogo Villaverde Cabral: "O assunto não tem relevância eleitoral suficiente. É uma querela das elites artístico-intelectuais".
Em banho-maria?
"Para António Costa, a questão surge na pior altura", admite, por seu turno, o politólogo André Freire. Villaverde Cabral considera que aquilo que pode ser mortal para António Costa é a divisão da esquerda. "Apostava que o Terreiro do Paço vai ficar paralisado até às próximas eleições", acrescenta. Também para Costa Pinto a política de alianças que o presidente da câmara conseguir, ou não, estabelecer com outras forças políticas para ir a votos será um dos múltiplos factores mais importantes do que este tipo de episódio. Ainda assim, neste contexto, António Costa só tem a ganhar em "afirmar-se como presidente da câmara", demarcando-se do Governo, observa. "Esta contaminação entre poder local e administração central pode não lhe ser favorável". Os três analistas são unânimes em considerar que o arquitecto devia ter sido escolhido por concurso público.»

2 comentários:

Anónimo disse...

O António Costa foi obrigado a embarcar num barco que não era o seu, Manuel Salgado vai à boleia e retirar largos dividendos.
António Costa sabia não foi por falta de o avisarem, agora meu amigo é tarde.

filipa lex disse...

Ter "costa" como apelido, meter "água" em inúmeras circunstâncias, escolher um vereador com o apelido "salgado", governar sem sereias, mas condescender com os tubarões, venerar o rio e os peixes, fá-lo o candidato perfeito a Rei Tritão e uma péssima escolha para presidente de Câmara. Quando é que abrem as urnas para a freguesia do Bugio???