17/04/2008

Auditoria às contas

In Público (17/4/2008)
Ana Henriques

«Sá Fernandes e Roseta contra ex-bastonário dos advogados na reabilitação ribeirinha. "Se fosse a votos, provavelmente era chumbado"

As contas da câmara de 2007, correspondentes a três gestões diferentes - final de mandato de Carmona Rodrigues, comissão de gestão provisória e início de mandato de António Costa - vão ser alvo de uma auditoria externa.
A proposta partiu do movimento de Helena Roseta e foi aprovada, até porque a lei a isso obriga. Salter Cid, do PSD, chamou a atenção do aumento de receitas do município entre 2006 e 2007: as receitas da taxa de esgotos subiram 30 por cento, as do imposto de transmissões de imóvel 20 por cento e as do imposto municipal sobre imóveis 13. "Foram os melhores resultados de sempre", observou o comunista Ruben de Carvalho.
Costa absteve-
-se a respeito da posição que a câmara deveria tomar sobre a indicação de Júdice pelo Governo
a A Câmara de Lisboa negou ontem pronunciar-se sobre o convite feito pelo Governo ao advogado José Miguel Júdice para dirigir a sociedade que vai reabilitar dois troços da zona ribeirinha da cidade. Os vereadores entenderam que não cabe nas competências da autarquia opinar sobre uma entidade da qual não fará parte, por falta de dinheiro para integrar o seu capital.
"Se não querem votar, que hei-de fazer?", reage o ex-bastonário dos advogados, que continua disponível para assumir o cargo. Júdice sublinha que tinha posto como condição para dirigir a sociedade que a maioria da Câmara de Lisboa não se opusesse à sua nomeação. Ora, ontem, apenas três dos 17 vereadores da autarquia - Sá Fernandes, Helena Roseta e uma colega sua de bancada - se mostraram frontalmente contra o seu nome. "Se fosse a votos, provavelmente era chumbado. Perante a recusa da câmara em pronunciar-se, se eu fosse o dr. Júdice, não aceitava" o cargo, referiu Sá Fernandes, que continua a dizer que o ex-bastonário não será mais do que um "capataz" da câmara, cujas ordens irá executar - apesar de a factura da reabilitação do troço entre Santa Apolónia e o Cais do Sodré e do troço Belém-Ajuda ir direitinha para o Governo, sem qualquer comparticipação financeira do município. O vereador eleito pelo Bloco de Esquerda diz ainda que não conhece ao ex-bastonário currículo para exercer semelhante cargo.
Depois de ter adoptado igualmente a designação de "capataz" para designar Júdice, Helena Roseta chamou a atenção para as suas "óbvias conotações com os interesses económicos da cidade de Lisboa", por via da profissão que exerce. "Vai ter que fazer uma declaração de interesses, por causa do conflito que haverá entre gerir uma empresa de capitais públicos e gerir interesses privados eventualmente convergentes", defendeu a vereadora. A analogia usada pelo ex-bastonário depois de o executivo camarário se ter recusado a votar o seu nome - "é como nos casamentos: falassem agora ou calem-se para sempre" - caiu mal à autarca, que retorquiu: "Não é um casamento, é um arranjinho. E em democracia não há um "calem-se para sempre". Isso é de outro regime".
"Teria perdido o juízo"
Quer Sá Fernandes quer Helena Roseta estão contra o modelo de reabilitação da zona ribeirinha encontrado pelo Governo, por entenderem que a sociedade de gestão da beira-rio não é necessária para nada. "Os quatro milhões que o seu funcionamento vai custar seriam mais bem investidos na melhoria da cidade", diz a ex-bastonária dos arquitectos, que considera "um escândalo que, através de um mero pretexto formal, a maioria da vereação tenha decidido não se pronunciar sobre a nomeação, viabilizando assim a indigitação de José Miguel Júdice".
O advogado, que tem até ao centenário da implantação da República, que se comemora em Outubro de 2010, para mostrar obra feita, e cuja nomeação está ainda por fazer, entende que as acusações de ligação a interesses económicos são "um disparate", mas mostra-se disponível para fazer todas as declarações de interesses que a lei lhe impuser. Ressalva, ainda assim, que não haverá qualquer conflito a este nível, uma vez que a sociedade que foi convidado para dirigir não se dedicará nem a projectos imobiliários nem a hastas públicas de terrenos. E recorda que, quando era bastonária, Roseta até o considerou suficientemente bom para o convidar para advogado da Ordem dos Arquitectos.
Ora, Júdice não poupa Sá Fernandes: "Se seguisse os seus conselhos [de não aceitar o cargo], era sinal de que tinha perdido o juízo. E ele devia estar calado, depois dos gravíssimos prejuízos que causou à cidade de Lisboa, por via das indemnizações relativas à paragem das obras do túnel do Marquês". O advogado deixa um desafio aos dois autarcas: "Que arranjem mais sete vereadores que achem mal a minha nomeação. Nesse dia vou-me embora".
"Mas só os dois não têm direito de veto sobre mim. Era o que faltava!", observa.
O presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, absteve-se na votação sobre se a autarquia devia ou não pronunciar-se sobre o modelo de gestão da sociedade e respectivos gestores - Júdice, que trabalhará a título gracioso, e mais dois vogais, estes remunerados. Já os restantes vereadores entenderam que a câmara devia manter-se em silêncio, com excepção de Roseta e Sá Fernandes, que gostavam de ter tido a oportunidade de chumbar o seu nome.
No entanto, a autarquia vai dizer ao Governo que os seus planos para reabilitar a zona entre Belém e a Ajuda são - nas palavras de António Costa - pobres e insuficientes, e que este deve aproveitar a oportunidade para requalificar as grandes parcelas de terreno que o Estado detém na zona. Em causa estão, nomeadamente, os quartéis da Calçada da Ajuda, um dos quais poderá desaparecer.
Apesar de toda a polémica, a nomeação de Júdice continua por fazer e sem data marcada. O próprio explica porquê: "O diploma do Governo para constituir a sociedade vai ter de ser promulgado pelo Presidente da República, o que só podia acontecer depois de o assunto ter sido discutido na câmara". Recorde-se que Cavaco Silva devolveu recentemente ao Governo um diploma que visava transferir para as mãos das autarquias as zonas ribeirinhas desafectadas de usos portuários. Só depois do "sim" do Presidente o ex-bastonário poderá ser nomeado. "Mas se o primeiro-ministro entender agora que não me deve convidar, não há problema nenhum", realça Júdice.»

1 comentário:

Anónimo disse...

Força Fernandes e Roseta! Júdice é sem dúvida um "capataz" de Sócrates e um "arranjinho" para Costa vender a Zona Ribeirinha afim de tapar o buraco financeiro da falida CML, a curto prazo.
Cavaco não engoliu o arranjinho por agora,a ver-vamos.
Júdice revela-se um ordinário,na sua argumentação,além de vira-casacas!
É para mim uma triste surpresa,pois cheguei a "votar" nele para Presidente(falou-se nisso).
Na verdade que currículo tem um advogado para gerir um Urbanismo tão delicado? Tal gestão caberia a uma equipa multidisciplinar de Arquitectos-Paisagistas-Engenheiros
-Geógrafos...escolhida em CONCURSO PÙBLICO !!
Aonde param(uma vez mais) as Ordens profissionais destes?

17-4-08 Lobo Villa