19/02/2008

Hotel do Governador em Belém

A notícia já tem quase um mês, e o texto mais de uma semana, mas aqui fica.
Expresso do sábado passado:

CML dá aval a hotel suspeito

Contradição Em Lisboa, um argumento que sustenta a nulidade dos negócios com a Bragaparques não impede uma obra junto à Torre de Belém

A Câmara Municipal de Lisboa (CML) aprovou o licenciamento de uma obra em Belém, zona para a qual não existe plano de pormenor, o que viola o Plano Director Municipal (PDM). A decisão (do PS e dos vereadores Lisboa com Carmona) foi tomada no mesmo dia (23 de Janeiro) em que António Costa considerou nulos os negócios com a Bragaparques. Neste dossiê, curiosamente, um dos motivos invocados é a falta de um plano de pormenor. A Feira Popular e o quarteirão em Belém têm a mesma classificação, segundo o PDM: “área de reconversão urbanística de uso misto”.

O Hotel do Governador, da empresa Carlos Saraiva II, está a ser reapreciado pelos serviços da Câmara, nos planos técnico e jurídico. Será analisado pelo mesmo crivo por que irão passar obras suspeitas citadas na sindicância. Em tese, enfrenta uma possível declaração de nulidade, cenário já conhecido quando a proposta foi aprovada. A empresa promotora disse ao Expresso não ter “qualquer conhecimento” da investigação e declara “confiança absoluta no seu procedimento processual no desenvolvimento deste projecto”. A deliberação camarária é o episódio mais recente de uma história polémica desde o início: decorreram obras sem licença de construção, o que motivou, em Novembro, um embargo. A decisão camarária permite colocar um telhado na estrutura. Fundamentação: proteger o que resta do secular edifício e também alguns achados arqueológicos. Na quinta-feira, a Carlos Saraiva II não fora ainda notificada do levantamento do embargo.

Cidadãos por Lisboa, PCP e Bloco de Esquerda (que votaram ao lado do PS a nulidade do processo Bragaparques) manifestaram-se contra o licenciamento agora deferido, proposto pelo vereador Manuel Salgado.

Para Helena Roseta, a proposta “viola o PDM”, sendo necessário um plano de pormenor. “Está tudo muito mal explicado; é um tipo de processo como os detectados na sindicância”. Para Roseta, “não pode haver duas bitolas” na avaliação. Também Ruben de Carvalho, do PCP, acha “completamente contraditório” o comportamento da autarquia. E acrescenta: “O processo sofre de uma sucessão de irregularidades”. Para o vereador comunista, “na prática, a obra vai prosseguir. E tenho receio dos factos consumados”.

Pedro Soares, do Bloco de Esquerda, critica a “volumetria excessiva”, num projecto com obras “ilegais, no interior”. Para Soares, que substituiu Sá Fernandes, “há uma atitude contraditória da Câmara. Teria sido mais avisado fazer uma avaliação prévia”.

A reapreciação do Hotel do Governador foi pedida pelo PSD (que se absteve na votação). A vereadora social-democrata Margarida Saavedra traça brevemente a longa e enevoada história desta obra: “Começou sem licenças; continua sem licenças”. Com efeito, apesar do edificado que se vê no local, nunca houve alvará de construção. “Uma inexplicável demora”, queixa-se a Carlos Saraiva II. O Expresso contactou o gabinete do vereador Manuel Salgado, mas não obteve qualquer resposta.

Paulo Paixão

EPOPEIA EM BELÉM

O pedido de licenciamento de obras de ampliação, reconstrução e alteração de exterior e interior da antiga Casa do Governador da Torre de Belém deu entrada na CML em Janeiro de 2003.

Apenas com licença de demolição, foram feitas obras ilegais (na génese do embargo). Achados arqueológicos obrigaram à alteração do projecto.

O CS Palace Belém Hotel (assim se chamará a unidade hoteleira) terá 63 quartos. Para um hotel de charme, a dimensão é considerada excessiva por vereadores contrários à deliberação.

A unidade terá “características luxuosas, mas espartanas”. Existirá um spa que “assenta na reinterpretação das termas romanas”.

Os promotores contam abrir no 1º semestre de 2009, se as obras se reiniciarem até ao final deste mês.

Em Fevereiro de 2006, a Câmara discutiu uma proposta de deferimento do pedido de licenciamento de obras. Viria a ser retirada porque se verificou que o promotor já fora notificado para levantar um alvará de construção quando ainda estavam por aprovar os projectos na especialidade (uma fase prévia do processo, obrigatoriamente).

Na mesma sessão, os vereadores constataram que havia outra obra (parte do projecto conjunto) ainda por concluir, ao fim de três anos: um parque de estacionamento.

O grupo CS tomou posse do terreno do parque de forma pitoresca. O solo, da CML, estava cedido à Moderna. Saraiva adquiriu o direito de superfície, por 50 anos, sem concurso público. Desalojou a universidade, cujos responsáveis, então na cadeia, foram apanhados de surpresa. Foi a primeira pedra de CS à sombra da Torre de Belém.

Uma epopeia ainda longe do fim.

1 comentário:

Anónimo disse...

Entretanto o projecto do mesmo empresário em Sapadores - Condominio Fábrica Favorita - está parado à meses, depois dos habituais lançamentos de sucesso, vendas a decorreram a bom ritmo, blá blá blá blá. Ficou a grua e o buraco onde deveria nascer o edificio. Alguém sabe o que se passa ? Ou foram apenas as vendas de sucesso que cansaram o Promotor ?